Nova economia e a relevância das boas (e novas) práticas de gestão
Empreendedor desde criança, João Kepler é sócio da Bossa Nova Investimentos, reconhecido como um dos maiores incentivadores do ecossistema empreendedor brasileiro. Na Expogestão 2020 falou com propriedade sobre a nova economia e gestão. Apresentou rapidamente seus livros, dois deles com a temática que ele abordou na palestra: Start Money e Os Segredos da Gestão Ágil por trás das Empresas Valiosas. Neste ele apresenta, junto com Thiago Oliveira, o que as empresas tradicionais precisam aprender com as startups e o que as startups devem aproveitar das tradicionais. Aproveitou para citar uma frase de Jorge Paulo Lemann que traz um conceito fundamental para a gestão: “Cuidar das pessoas de uma empresa, parte significativa de seu capital intelectual, é tão necessário como vender. Sem isso, nenhum empreendimento se sustenta. Formar gente boa é o melhor negócio que se faz”.
Qual o grande segredo das empresas valiosas? Elas resetaram o chip da mentalidade empresarial e passaram a dar agilidade no DNA empresarial. Empresas jovens têm visão de futuro, visão focada em resolver problemas. Diferente do muitos pensam, empreendimento com gestão ágil não é aquele que cresce mais rápido no começo – e sim aquele que cresce mais, constante e melhor, no médio prazo. Resumindo, cresce com velocidade, mas com algum controle, o que dá sustentabilidade ao negócio.
Os negócios mudaram de maneira irreversível com a evolução digital. Os negócios, mesmo tendo camadas de serviços tradicionais, têm camadas tecnológicas que dão velocidade e agilidade. Exemplificou com empresas como Wework, Gympass, Wine, Spotify, Uber, Airbnb. Elas oferecem serviços ou produtos tradicionais, mas com uma camada tecnológica e uma forma diferente de vender.
Essa nova forma de fazer negócios segue em paralelo com a grande mudança social, explicou Kepler. As mudanças chegaram, estão no celular, mas o ser humano ganhou uma dimensão personalizada. As empresas não falam com pessoas. São pessoas que falam com pessoas. Por exemplo, destacou o palestrante, antes de ir a um restaurante ou comprar comida por aplicativo, você lê as avaliações, vê comentários. De pessoas para pessoas. Essa evolução social provocou uma nova forma de pensar, novo poder, nova força de trabalho, novas profissões, novos modelos de negócios, novo estilo de vida, novas possibilidades, novas audiências, novos consumidores, novo marketing e novos gestores.
Na sequência abordou a nova mentalidade que deve estar presente nos empreendedores, focada em negócios, entendendo de forma muito clara o comportamento do consumidor. Ele falou sobre as diferenças entre a empresa tradicional e a nova empresa. Enquanto na primeira os olhos estão voltados para o capital tangível como estrutura física, equipamentos, mesa, cadeiras etc., a segunda tem como prioridade o capital intangível, formado por conceitos, forma de trabalhar. Uma organização em que é possível evoluir em qualquer lugar, independente de um espaço físico. Para ilustrar, Kepler falou sobre as padarias em São Paulo. Se não tiver o tradicional café com pão na chapa, não é padaria. A Starbucks veio ao Brasil. Ela tem um cardápio e uma forma de fazer padronizada em todo mundo. Para chegar em São Paulo teve que entender o seu consumidor, a chamada “persona”. Assim, criou, de forma inédita na rede, o pão na chapa. Então, por mais que seja uma empresa tradicional, bem sucedida, precisa entender essa nova economia, baseada na “persona”.
A mudança é muito mais do que tecnologia e estrutura, é uma mudança social, de comportamento. Na nova economia, o empresário dá lugar para o empreendedor. Enquanto aquele foge dos problemas, este busca por problemas, pois entende que é na solução dos problemas que se ganha dinheiro. Da mesma forma, o empresário quer hierarquia e modelos e rituais que se repetem. O empreendedor valoriza a autonomia, a criatividade e a ousadia. O palestrante complementou: “o foco do empresário é ‘no’ cliente e o do empreendedor é ‘do’ cliente”. E, por fim, destacou uma que talvez seja a maior diferença. Na velha economia, o objetivo é escalonar. Na nova, escalar. Escalar é crescer em resultado e receitas sem aumentar a despesa na mesma proporção.
E assim vem a pergunta crucial: “meu negócio está preparado para as mudanças?”. É difícil responder. Novamente ilustrou com um exemplo. A Apple começou em 2001. Conhecida pelo iPod, iPhone e outros produtos. Em 2019 se reinventou. Passou a trabalhar como plataformas de negócio, baseada na nova economia. Assim passa a ter receita com a venda de serviços no App Store, a loja de aplicativos da Apple. Parece fácil, pois é uma empresa de tecnologia. Então, Kepler trouxe o exemplo de outra empresa tradicional, a RedBull, que desde 2994 fabrica um único produto, um energético. Em 2019 passa também a se caracterizar como plataforma de negócios. Uma equipe de Fórmula 1, time de futebol, uma plataforma de entretenimento que gera receita sem depender da fabricação de energético. Ela só precisa da comunidade que criou com a marca.
A questão seguinte é como fazer. A resposta é pelo “RE”. REaprender, REfletir, REplanejar, REfazer e REcomeçar. Mesmo se a empresa é tradicional e está indo bem, lucrando, é fundamental repensar o negócio, pois as mudanças estão acontecendo de forma muito rápida. É preciso buscar conhecimento complementar além da informação em si, porque informação é fácil, tem no Google. Mas conhecimento só consegue quem coloca em prática, quem implementa em seu negócio.
Para se manter ou vencer é preciso de novas competências, pois os bons resultados que você conseguiu até agora não garantem os resultados do futuro. João Kepler novamente usou uma alegoria para explicar como desenvolver as competências necessárias para a os bons resultados. Disse que as habilidades devem ser pensadas como um aplicativo de celular. Ele é avaliado constantemente pelos usuários, passa por atualizações regulares, resolver um problema que você precisa. Dessa forma, pense bem. Você está sempre atualizado? Está incorporando novas funcionalidades? Corrigiu os bugs? Qual seu diferencial, qual o problema que você resolve? O que seus usuários, seus clientes pensam sobre você?
A partir disso, Kepler passou a explicar quais as novas competências. A primeira é a emocional. Essa envolve competência pessoal, que estabelece uma conexão consigo mesmo e reflete em atitude, otimismo, feeling e superação. E a competência social, que envolve relacionamento com o próximo, com os clientes, com a equipe e requer atitudes como servir, liderar, ganhar, competir. Aí entra a competência empreendedora, que exige que você seja um resolvedor criativo; anti-frágil, que é o poder de recuperação após a queda; precisa entender e praticar a colaboração e a cocriação; manter o espírito de aprendizado on, aprendendo o tempo todo; e a adaptabilidade, que ganhou ainda mais força com a pandemia. Para buscar isso é preciso estar insatisfeito e incomodado de uma forma positiva, para gerar a transformação necessária para buscar melhorar sempre. E essa mentalidade pode evoluir quando a pessoa pensa em novos caminhos, novas amizades, nova postura, novas ideias, novas ações, novas conexões e novas oportunidades. Esse é um ciclo que deve se repetir.
Finalmente o palestrante detalhou um pouco mais sobre negócio escalonável. Nele as receitas sobem descoladas das despesas, o que gera mais lucro. Não adianta a empresa vender mais se os custos sobem na mesma proporção. Aí que entra a importância da camada de serviço diferenciada, que pode ser na comercialização, no relacionamento ou na própria operação. Neste aspecto, reforçou, a atitude da mudança faz a diferença. “Faça o que puder, com o que tiver e onde estiver, sem desculpas, mas faça”, apelou João Kepler. Outra dica foi sobre o benchmarking. É fundamental ampliar a visão comparando-se com outros negócios, diferentes do teu e não do mesmo ramo. Isso facilita você sair do óbvio, de fazer mais do mesmo. Muitas companhias também precisam fazer uma revitalização em sua Missão, Visão, Propósitos. Exemplificou com uma floricultura. Seu propósito não deve ser “vender as melhores flores por um preço justo” e sim “encantar as pessoas com nossas cores e perfumes”. Essa mudança de propósito faz toda a diferença. Kepler ainda explicou que “na nova economia as pessoas vão querer se relacionar com você porque representa alguma coisa para elas”.